Mr. Domingues

Sempre ouvi que escrevo demais, e-mails longos, cartas intermináveis para namoradas, nunca consegui usar Post-it, enfim, bem ou mal eu gosto de escrever. A intenção é que isso aqui sirva como uma "descarga mental" onde comento fatos, acontecimentos e pensamentos, na verdade, tudo que me der vontade. Sabe quando se vê um filme, lê um livro ou algo no jornal e ficamos com vontade de discutir com alguém sobre o assunto? É pra isso que esse espaço serve, assim eu incomodo menos quem está à minha volta e começo a incomodar anônimos internet afora que queiram ser incomodados. Mas é claro que não vou fugir muito dos meus hobbies, interesses pessoais e profissionais, como saúde, atividade física, esporte, tecnologia e música.

sábado, 26 de junho de 2010

Pais & Filhos

Quando se faz pesquisas envolvendo a população, uma das coisas que seguidamente ouvimos é: o que o povo receberá em troca? Realmente, em muitas vezes os pesquisadores “usam” a população sem dar nada em troca e na maioria das vezes o que se recebe é de forma indireta - o conhecimento científico aumentado pode resultar em melhores cuidados em saúde. Mas isso é meio difícil de ser entendido.
Outra forma de dar algo em troca é quando os resultados de uma pesquisa são divulgados de forma ampla com a intenção de mudar a vida das pessoas, ou pelo menos para fazer com que os envolvidos pensem no assunto. Eu tive a felicidade de ter meu trabalho de doutorado (sobre exercício físico na gestação) muito divulgado no país: Revista Saúde É Vital (Editora Abril), Folha de São Paulo, Zero Hora, Jornal Agora (de Rio Grande), Revista SuperAção (especializada em corrida), Rádio Manchete, e mais uma série de reportagens em sites que copiaram as matérias de outras fontes. De vez em quando “I Google myself” e vejo que até hoje seguem publicando coisas por aí com o meu nome, às vezes me impressiono com as palavras que atribuem a mim. Para essa pesquisa eu contei com a colaboração de quase 5 mil mulheres e com certeza um número muito maior de grávidas teve acesso às matérias e de alguma maneira usaram essa informação. Tarefa cumprida.
Agora mais uma vez tenho a sorte de participar de uma pesquisa com ampla divulgação. Não como primeiro autor, mas fui co-orientador de doutorado do Samuel Dumith que estudou atividade física dos adolescentes nascidos em 1993 na cidade de Pelotas. O estudo com mais de 4 mil jovens foi noticiado na Folha de São Paulo, Zero Hora, Rádio Jovem Pan, diversos sites e hoje novamente na Zero Hora, dessa vez na coluna do Moacyr Scliar.
Entre os resultados estão constatações que todos percebem ao analisar o comportamento dos adolescentes de hoje: eles estão fazendo muito mais atividades sedentárias do que antigamente. Menos da metade dos jovens faz o que deveria fazer em termos de exercício. Os prejuízos visíveis agora são mínimos e normalmente não passam do jovem “gordinho”, mas o que será dessa geração dentro de 40-50 anos ninguém sabe, já que nunca se viu alguns problemas como diabetes tipo 2 em crianças, mas agora isso é uma realidade.
Os meninos são mais ativos do que as meninas e pra isso não precisamos de pesquisa, basta perguntar para qualquer professor de educação física escolar sobre o comportamento dos jovens durante uma aula - as meninas inventam todas as desculpas possíveis e impossíveis para não se mexer, fazem questão de trajar roupas impróprias à atividade, usam a menstruação como impedimento, têm “pavor” de suar, entre outras. A observação de competições esportivas denota a mesma diferença - em qualquer corrida de rua, por exemplo, a quantidade de mulheres na linha de largada costuma ser 10 vezes menor que a de homens. E isso se reproduz em diversos esportes. Por outro lado, o esporte profissional nunca envolveu tanto dinheiro nem foi tão divulgado quanto hoje em dia. Uma geração de fãs e adoradores que nada mais faz além de observar (normalmente comendo porcarias ao mesmo tempo).
E as gerações anteriores já nos mostraram que, se um jovem é ativo, a chance dele ser um adulto ativo é muito maior do que se ele for sedentário na juventude: jovens sedentários tornam-se adultos sedentários.
O exemplo para atividade física deve partir de casa, desde cedo. Pais sedentários criam filhos sedentários, que se tornarão adultos doentes. O pai que tem como conceito de esporte assistir fórmula 1 e futebol pela TV cria filhos que o usam como exemplo, atletas do controle remoto.
A mensagem principal da pesquisa é para os pais: mexam-se e sejam exemplos para seus filhos, ambos ganharão com isso.

sábado, 5 de junho de 2010

Clínica de natação
Participei no último fim de semana de uma clínica teórico/prática de natação com o técnico Cezar Augusto Bolzan. Não entrei na água, fui apenas como professor/ouvinte. O professor Cezar é gaúcho de Santa Maria, formado na UFSM e com cursos posteriores na UFRGS e outras. Foi nadador na década de 70 e desde os anos 80 trabalha na preparação de nadadores do Brasil e de outros países. É membro de associações como a American Swimming Coaches Association (ASCA - USA) e da National Coaching and Certification Programs (NCCP - Canada) tendo realizado estágios em diversos centros de treinamento mundo afora, inclusive no Colorado Springs Olympic Training, onde a maioria dos atletas olímpicos norte-americanos treina e possivelmente o centro de treinamento mais avançado do mundo.
A minha intenção no curso era ouvir algo novo na área de treinamento, mas pelo tempo curto (6 turnos de curso) só foi possível a abordagem das técnicas dos 4 nados, com pouquíssimas palavras sobre treinamento. O público ouvinte era de aproximadamente 70 pessoas, metade atletas e metade professores/estudantes. Gente de Pelotas, Porto Alegre e Rio Grande. Técnicos de equipe competitiva só vi 3 (que eu saiba); a Marlise Geri (Energia, Rio Grande), Mario Leite (Caixeiros Viajantes, Porto Alegre) e o próprio Nico (Brilhante, Pelotas). Surpreendeu-me a baixa procura pelo curso dos alunos da UFPEL (universidade onde sou professor e que era uma das entidades promotoras do curso). Essa baixa procura (creio que 4 alunos apenas) demonstra claramente o baixo interesse por esse esporte na nossa região (sul do Rio Grande do Sul). E isso se reflete diretamente no nível dos atletas da região, é um ciclo vicioso - pouca gente treina, poucos professores se especializam na área, os resultados não aparecem, o interesse cai mais ainda...
Ao ver os praticantes que caíram na água percebe-se que a realidade continua sendo: 3-4 adolescentes na casa dos 20 anos nadando bem e treinando sério, meia dúzia de masters (pessoal que treina e compete por prazer e que não tem tempo pra treinar pesado) e uma gurizada entre 12-15 anos, aquela geração que “promete” e que em 99% dos casos abandona o esporte antes dos 18 anos.
Uma coisa que gostei no discurso do Cezar foi justamente essa realidade que ele fez questão de demonstrar. Diferente de outros palestrantes na área que gostam de mostrar o sucesso das nossas exceções e apontar o plano para o sucesso de gente como Xuxa, Gustavo Borges, Thiago Pereira, Cielo’s e CiA. ele aponta uma série de razões para que a natação brasileira seja tão ruim quanto é. Nunca vi essa estatística, mas tenho a impressão que a natação brasileira consegue produzir em média um bom atleta olímpico a cada 10 anos. E mesmo assim, a maioria só se destaca depois de sair do país.
Como professor e nadador/triatleta não vi nenhuma grande novidade ou descoberta, mas alguns pontos destacados por ele em relação à natação brasileira e que valem para a maioria dos esportes em nosso país:
- inexistência de programas de detecção de talentos;
- queima do atleta no início da carreira, levando ao esgotamento principalmente psicológico;
- direcionamento de provas equivocadas para as faixas etárias (provas curtas para crianças - que fisiologicamente têm uma capacidade anaeróbica muito baixa);
- falta de interesse da mulher brasileira pelo esporte, e mesmo as que procuram o esporte não costumam encarar da mesma forma que as estrangeiras;
- falta de conhecimento e de atualização dos treinadores nas áreas de fisiologia do exercício e treinamento desportivo;
- excesso de treinamentos com baixa especificidade;
- a realidade da maioria dos clubes e escolinhas de 1 treinador para 20-30 atletas não permite um desenvolvimento atlético satisfatório;
- falta de uma visão da saúde global do atleta e não apenas profilaxia de lesões esportivas;
- desleixo de muitos treinadores nos detalhes que podem ser melhorados com ajuda de recursos simples como fotos e filmagens;
- erros gritantes nas dietas dos atletas;
- falta de estrutura para treinar fora dos grandes centros, o que obriga muitos atletas a se deslocarem para longe do núcleo familiar e muitas vezes isso gera desequilíbrios;
- preocupação excessiva com os tempos e com o treinamento físico quando detalhes técnicos impedem o resultado excelente, muitas vezes gerando lesões, etc.

Na parte mais técnica, algumas coisas interessantes que estão mudando com a natação mundial, como a importância que assumiu hoje em dia o nado submerso, que em algumas provas (de piscina) pode representar metade da distância nadada na prova. Esse é o tipo de “estalo” que às vezes falta e que diferencia um bom nadador de um vencedor. Ele também mostrou conceitos de biomecânica e hidrodinâmica, que avançaram muito com os maiôs high tech. Ele próprio um ferrenho defensor dos maiôs, mas mesmo que eles não sejam mais usados, toda a pesquisa feita para desenvolvimento dos tecidos e os desenhos das roupas colaboraram em muito para a compreensão do que deve ser feito em termos de posicionamento do nadador para atingir maiores velocidades, principalmente na fase submersa do nado.
Senti falta no curso dos assuntos que estavam em destaque no cartaz de divulgação, como: “prescrição de treinamento” e “avaliação e performance”. Claro que, de tudo que ouvi não concordo com 100% do que foi dito, mas ele me pareceu um ótimo profissional. Digamos que um excelente professor de beira de piscina, com muita experiência e com “bom olho”, que está se aventurando também na área acadêmica e de gestão-marketing.
A clínica teve apoio do Clube Brilhante (Nico) e da UFPel (Francisco Tavares, o Chico).
Cezar Bolzan no Twitter - http://twitter.com/@cezarbolzan
Blog - http://swimcamp2010.blogspot.com/